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VI - ORIGEM DA CULTURA OCIDENTAL: CIÊNCIA

1. Novas Evidências da Existência de Deus

José Carlos González-Hurtado

(Francisco Laranjinha)

Existe o mito na cultura atual de que a ciência se opõe ao teísmo. Este é um desses mitos que só encontra igual paralelo no mito de que a Terra é plana. 

De facto, qualquer estudo histórico minimamente sério revela o absurdo desta ideia. Contudo, José Carlos González-Hurtado vai mais longe na medida em que não se limita a rebater um mito altamente difundido na cultura secular. A tese fundamental do livro de González-Hurtado é a de que o progresso científico deixa o ateísmo sem nenhuma explicação plausível ou, dito de outra forma, um olhar para a ciência moderna sem prejuízos leva necessariamente à ideia de Deus.

Diga-se de passagem, os argumentos apresentados pelo autor são de peso, abundam em referências e os resultados científicos são expostos de forma clara e precisa. Deste modo, o leitor consegue compreender resultados científicos complexos e a sua pertinência para o debate sobre a relação entre ciência e religião.

Sem dúvida que numa narrativa apologética, e especialmente dentro do debate sobre fé e razão, é importante começar por clarificar aquilo que se entende por ‘Deus’ e os limites do que Dele se pode conhecer através da razão. Neste sentido, o livro toca temas da ciência moderna com extrema relevância filosófica e teológica precisamente porque explica o tipo de crença teísta que as novas descobertas científicas impõem. Neste sentido, apesar do autor ser católico, a defesa teísta do livro não vai além de um algo/alguém, omnisciente e não criado ao qual chamamos ‘Deus’, mas que podia igualmente ser chamado de ‘causa primeira’.  

 

O autor sustém que o ateísmo é uma forma de fé (em negativo) e que não se baseia nem na ciência nem na razão e que, por isso, torna-se difícil defender este tipo de posição. Primeiro historicamente, ou seja, a narrativa histórica é particularmente rica na enumeração dos ‘grandes’ da ciência do séc. XX que se converteram (alguns ao catolicismo) precisamente pela tensão existencial que os seus descobrimentos científicos impunham. Falamos aqui de autores que são considerados as grandes figuras da revolução científica do séc. XX e muitos deles prémios Nobel. Einstein, Planck, Compton, Schalow, Townes, Smoot, Zeilinger, Hoyle, Collins, Riemann, Mendel, Gödel, LemaÎtre e Von Newman apenas para citar alguns.

 

Além disso, e de forma mais geral, encontramos exemplos de casos de estudo, uns mais conhecidos do que outros, sobre atitudes do cientismo ateu. Algumas bastante conhecidas como é o caso da resistência da comunidade científica à teoria do Big Bang, e em alguns casos menos conhecidos. Cito dois particularmente interessantes que aconteceram na União Soviética e que tiveram consequências absolutamente trágicas. Um deles trata-se do provável envenenamento de Friedmann após demonstrar um erro nas equações de campo da Relatividade Geral de Einstein (o que comprovava a teoria do átomo primordial de Lemaître), e o outro foi a deportação de um conjunto de cientistas do observatório astronómico de Pulkovo.

 

Em segundo lugar, o autor revela a fraqueza da posição ateia, simplesmente pela sua falta de rigor intelectual. É esta falta de rigor intelectual, aliada a uma preocupação desmesurada dos ateus em atacar acerrimamente qualquer posição teísta, que levou a um conjunto de propostas e hipóteses que nada têm de científicas. É o caso da teoria do multiverso que, segundo o autor, não passa de uma tentativa desesperada de tentar evitar a noção de Deus. Note-se também aqui uma inconsistência ateia no sentido existencial. Inúmeros cientistas cristãos ou teístas do séc. XX, deram contributos inacreditáveis à ciência e são considerados hoje como figuras marcantes da prática científica. Nenhum deles levou Deus a priori para as suas investigações. Aliás, muitos deles eram agnósticos ou ateus a priori. O que a narrativa histórica mostra é que a sua conversão está intrinsecamente associada à sua prática científica. Ou seja, Deus é uma consequência dos seus resultados científicos.

 

Pelo contrário, os ateus tentam a priori propor hipóteses pseudocientíficas com o intuito de negar a ideia de Deus e/ou de qualquer tipo de imaterialidade na Natureza. Obviamente, o autor evidencia que esta posição está em evidente contraste com a posição dos cientistas teístas que, de forma até bastante prudente, apenas propõem que a ciência atual sugere fortemente a ideia de uma realidade transcendente. Aqui está o debate!

 

A meu ver, apesar de o autor deixar implícito, o leitor percebe uma forte sugestão de inversão de papéis. O materialismo ateu e o cientismo foram infinitamente mais prejudiciais à prática científica e à produção de conhecimento científico do que o teísmo. Inverte-se o mito do primeiro parágrafo desta recensão. Esta não é a tese principal do livro, mas a meu ver a sugestão é forte e a aderência à ideia reside na liberdade do leitor.

A leitura deste livro, não obstante, revela problemas epistemológicos de algum modo calados na secção da Biologia. Nesta secção, ao contrário da secção da Física e da Matemática, apresenta-se a tese maioritariamente a partir de um problema científico que não se entende agora, ao invés de esta ser apresentada a partir de resultados já algo estabelecidos. Apesar do problema do início da vida e da teoria da evolução serem problemas magnânimos para a ciência, há sempre a possibilidade de serem explicados no futuro e, portanto, aqueles que invocam a necessidade de Deus para os explicar, nesse cenário, ficariam sem argumento. Aliás, bastaria existir a possibilidade teórica para que os teístas ficassem numa posição difícil.

 

Contudo, também são dadas evidências a partir do que a Biologia conhece o que, a meu ver, reforça muito mais o argumento teísta. De facto, procurar a Deus a partir do deslumbre provocado por aquilo que já se conhece é particularmente importante no caso da ciência. Não é por acaso que Bonhoeffer dizia que devemos procurar a Deus no que conhecemos, não no que ignoramos. Ou para sintetizar, usando as palavras de um grande físico, prémio Nobel e teísta do séc. XX:

“The first gulp from the glass of natural sciences will turn you into an atheist, but at the bottom of the glass God is waiting for you.” Werner Heisenberg

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